Dirigentes Desportivos: A Urgência de um Estatuto Justo e Reconhecido

Com duas décadas de experiência na estrutura organizacional do futebol profissional, em particular na Liga, constatei que, apesar do tempo decorrido, a realidade dos dirigentes desportivos mantém-se praticamente inalterada. Estes continuam a ser a espinha dorsal do desporto amador, acumulando cada vez mais responsabilidades e obrigações, sem o devido reconhecimento ou apoios adequados para a função essencial que desempenham. Trata-se de um trabalho árduo, muitas vezes invisível, mas absolutamente determinante para a continuidade e o desenvolvimento do desporto de base.

O estatuto do dirigente desportivo continua sem uma regulamentação clara e justa, deixando muitos destes agentes sem os direitos e garantias que merecem. São eles que asseguram o funcionamento dos clubes, enfrentam desafios administrativos e financeiros, garantem condições para atletas, treinadores e demais intervenientes, e ainda lidam com exigências legais e burocráticas cada vez mais complexas. No entanto, apesar do papel fulcral que desempenham, continuam a ser tratados como meros voluntários, sem qualquer proteção ou incentivo.

A Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto (Lei n.º 5/2007) remete a função do dirigente para um regime de voluntariado, garantindo apenas um seguro desportivo. Esta medida, manifestamente insuficiente face às responsabilidades assumidas, cria uma disparidade injusta em relação a outros setores do desporto, onde certos dirigentes beneficiam de regalias e apoios institucionais que lhes permitem exercer as suas funções com maior estabilidade e segurança. Esta desigualdade desvaloriza o trabalho dos dirigentes de base e compromete o futuro do associativismo desportivo, que depende da dedicação de pessoas que, na maioria dos casos, exercem estas funções sem qualquer retorno material.

Com a nova direção da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) em funções desde 24 de fevereiro, surge uma oportunidade de mudança. No programa do Presidente eleito, Dr. Pedro Proença, a área do Desenvolvimento e Coesão inclui precisamente a figura do Dirigente Benévolo, prevendo a análise, junto das entidades competentes, da possibilidade de revisão do estatuto do dirigente desportivo em regime de voluntariado. Entre as medidas propostas, destacam-se a majoração da atividade, um regime fiscal privilegiado, a contagem diferenciada do tempo de serviço, a isenção de encargos e a dispensa do tempo de serviço. Perante esta perspetiva, resta saber se, desta vez, este tema finalmente terá um desfecho positivo.

Vários dirigentes de associações de futebol e de outras modalidades têm vindo, ao longo dos anos, a defender esta causa, sublinhando a necessidade de uma mudança estrutural. Trago novamente este tema para discussão porque, com as recentes alterações nos órgãos federativos, como anteriormente referido, acredito que este é o momento oportuno para recolocar a questão na agenda. É fundamental promover um debate sério e exigir soluções concretas que dignifiquem e protejam aqueles que asseguram a sustentabilidade e o desenvolvimento do desporto nacional.

Se queremos garantir um futuro sustentável para o desporto amador e para a formação de jovens atletas, é fundamental que haja uma revisão profunda do enquadramento legal dos dirigentes desportivos. A criação de um estatuto específico, com direitos e apoios concretos, permitiria não só dignificar o seu papel, mas também incentivar a renovação e a continuidade do associativismo desportivo.

Esta luta pelo reconhecimento não deve ser isolada. Outras modalidades desportivas enfrentam desafios semelhantes, pelo que a união entre diferentes agentes do desporto pode ser a chave para promover mudanças estruturais que beneficiem todo o setor. Só assim poderemos construir um desporto mais justo, sustentável e valorizado para as gerações futuras.

Fernando Arménio Silva

Vice-Presidente da Associação de Futebol de Braga